15.1.08

Este foi ainda um Natal organizado

Este foi ainda um Natal organizado. Com muita gente, felizmente, muita gente da família e por isso mais feliz, mas organizado. Este Natal passei-o num país organizado, especialmente organizado, ou conhecido por isso: a Suiça. Este Natal passei-o em Genebra, com fuga de uma manhã até Nyon, a quinze minutos de comboio. Neste Natal recebi presentes. Embrulhados, enfeitados, etiquetados. Organizados. Neste Natal comprei e recebi produtos da Hennes & Mauritz, empresa organizada, incrivel, impecável, justamente organizada. Confiram no seu organizado sítio. Neste Natal senti o frio e a humidade genebrinas (?), o primeiro graduado nos seus graus, escalada na sua alta percentagem a segunda. A seu tempo os dois. Organizados. Neste Natal recebi um Moleskine. Se não para organizar, pelo menos para compilar. Ideias. Whatever. Se os houver. O que houver. Neste Natal escrevi no Moleskine. Fiz um esforço. Mas não sobre o Natal. Foi no dia vinte e sete, já quase de talheres na mão para o jantar, um dos fantásticos preparados pelo meu fantástico cunhado, além disso cozinheiro. De profissão e de coração. E assim foi:
"Aqui, perto da casa de uma das minhas irmãs, existe um edifício, de construção antiga, onde, até há não muito tempo, residiam "Okupas" (ou um derivado, acrescento agora). Nunca o vi por dentro, mas a sua decoração exterior, na altura, era interessante.
Soube que por altura de uma reunião do G8 nesta cidade houve distúrbios. Soube que faziam parte dos "arruaceiros", que destruiram carros e outras propriedades alheias, os, ou alguns dos habitantes deste prédio, no mínimo, pitoresco.
O rigor suiço, depois desta aventura, se os tolerou até aí, a eles que não pagavam renda, nem impostos sobre a "sua" habitação, a eles que se limitaram a exigir como direito a ocupação de um prédio desocupado, expulsou-os. Do prédio.
Ocorre-me dizer, a propósito, que os anarquistas e as suas ideias só são possíveis em sociedades organizadas (e parece-me que dizer sociedade organizada é quase uma redundância). Assim não fosse, por que escolheriam a Suiça, e em particular Genebra, para viver à sua maneira (provavelmente porque aí nasceram)? Ocorre-me verificar que, se de repente todos, mesmo todos, decidissem viver desse modo tão à vontade, a "organização" anárquica, por estranho que pareça, sucumbiria. Dito de outro modo, a excessiva desorganização que tal facto provocaria, levaria a que alguém tivesse que tomar a iniciativa de organizar a desorganização da agora, e só agora, verdadeira anarquia.
A anarquia é uma ideia e um sistema infantil. Comparo-a aos filhos que reclamam para si independência e liberdade, mas que vivem à conta dos pais e na tranquilidade do lar, "irresponsavelmente". A anarquia só sobrevive debaixo das asas da sociedade mãe.
Pergunto-me se o anarquista não ficaria à beira de um ataque de nervos se os donos do supermercado, da padaria ou das bombas de gasolina do seu bairro se convertessem ao seu modo de vida.
A piada estaria em ouvir um deles dizer, quando todos fizessemos o que nos desse na real gana, qualquer coisa deste género:
- Mau, pessoal, assim não dá! Temos que nos organizar!!"

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